quarta-feira, dezembro 12

Suicídio no fim da tarde chuvosa. Apodrece decomposto pelos vermes do concreto. DESCANSE EM PAZ

Early rainy evening suicide. Rottens decomposed by the concreteworms.
REST IN PEACE

terça-feira, dezembro 11

Mudei-me de caverna: agora estou numa com vista para a cidade, com pia & fogão. Hoje comprei um filtro de barro (o trabalho enobrece o homem) e um butijão de gás. Já conheço, ou pelo menos sei quem são os habitantes dos buracos adjacentes: Três Adrianos, Luis Carlos, e Isabel, uma negra gorda que disse costumava fazer a ponte aérea São Paulo-Salvador a trabalho às expensas de um antigo rico patrão. Parece que faz capoeira e freqüenta centro espírita. Limpa a casa (a parte que nos cabe dela) nas poucas horas vagas, o que é excelente. O Adriano vizinho da sacada chegou na pensão para ficar por seis meses após o divórcio e está há treze anos. Tem discos do Roberto Carlos e dos Bee-Gees, um filho e fala com o cigarro na boca. Outro Adriano é o velho gordinho que ronca, ex-vizinho direto. Sempre o encontro sentado à mesa da lanchonete ao lado com uma lata de cerveja, mexendo no celular, e camisa do José Serra. Sua referência é a televisão (dorme com ela). O terceiro Adriano senta no sofá da frente para fumar, faz as mesmas perguntas diversas vezes e não retém as conversas direito. Ouve rádio alto e muitas vezes fora do ar. Luis Carlos é o confeiteiro cearense. Seu quarto tem paredes finas de madeira que o fazem ouvir tudo que passa pelo corredor. minha caverna anterior está agora desocupada, os habitantes desta que estou, um senhor quase mudo e sua filha, mudaram-se. Enfim. Hoje a noite promete, e já tarda. A ela.

(sábado, 8 de dezembro, por volta das 22h)

segunda-feira, dezembro 3

Sound art (arte com som), como seu padrinho, a música experimental, está de fato entre categorias, talvez porque seu efeito no ouvinte esteja entre categorias. Não é emocional nem é necessariamente intelectual. A música ou estimula, reforça, ou toca experiências emocionais, direta (por meio das letras) ou indiretamente (pela melodia e harmonia). Mesmo a música eletrônica e experimental, que é muitas vezes pensada como não-emocional ou intelectualizada, ainda lida com o processo de pensamento, tecnologia e comportamento humanos. O amor de Cage à natureza e a todos os sons ainda os enquadra (ordena) como um recurso natural a ser aproveitado por um compositor, ou como um transbordamento aural humanista da civilização. A música fala a um ouvinte como um ser humano, com toda a complexidade que isso implica, mas a sound art, a menos que empregue o discurso, fala a um ouvinte como a um habitante vivo do planeta, reagindo ao som e ao ambiente como qualquer animal faria (com toda a complexidade que isso implica). Isto soa desumanizante, mas este apelo a um denominador comum primal pode, de fato, mostrar o gesto humano em seu aspecto mais benevolente e menos engrandecedor. Ao tomar o som não como uma distração ou como moeda corrente, mas como algo elemental, [a sound art] pode, potencialmente, apontar ao tipo de consciência cósmica ao qual a arte tanto aspira.



Sound art, like its godfather experimental music, is indeed between categories, perhaps because its effect on the listener is between categories. It’s not emotional nor is it necessarily intellectual. Music either stimulates, reinforces, or touches on emotional experiences either directly (throught lyrics) or indirectly (through melody and harmony). Even electronic and experimental music, which is often thought of as unemotional or intellectualized, still deals with human thought process, technology, and behavior. Cage’s love of nature and all sounds still frames them either as a natural resource to be harnessed by a composer, or as humanist aural spillover from civilization. Music speaks to a listener as a human being, with all of the complexity that entails, but sound art, uness it’s employing speech, speaks to the listener as a living denizen of the planet, reacting to sound and enviroment as any animal would (with all the complexity that entails). This sounds dehumanizing, but this appeal to a primal common denominator may, in fact, show human gesture at its most benevolent and least aggrandizing. By taking sound not as a distraction or currency but as something elemental, it can potentially point to the kind of cosmic consciousness that so much art aspires to.

Alan Licht, Sound Art: Beyond Music, Between Categories. New York, Rizzoli, 2007. Tradução por Saulo Alencastre.

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